segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O olhar da cidade sobre a criança

Abertura do 5º Seminário Latino Americano de Educação Infantil da RedSOLARE Brasil



*Elaine David Pires



Reggio Emília é uma “cidade” que olhou para a criança e a infância como suas grandes possibilidades de recriação e reconstrução social. É uma cidade que vê a criança como cidadã com direitos e por direito. E, que, portanto, tem direito à educação de qualidade, à manifestação e à escuta atenta. Além de ser reconhecida como protagonista competente com capacidade inesgotável de criação e construção, respeitada no seu equivocar-se (faz parte do caminho), nas suas cem linguagens, cem formas de ler e comunicar sua compreensão de mundo... para si e para o mundo.

E, qual "O Olhar da Cidade sobre a Criança"?

Qual é o olhar que as cidades do Brasil depositam sobre nossas crianças?

Em muitos momentos e instâncias, de modo massificador, um olhar de consumismo, de sexualidade antecipada, de mão de obra barata ou escrava, de moradores de rua sem escolas e sem escolhas, outras com excesso de escolhas construindo o conceito de que liberdade está associada ao “eu quero, eu posso” independente do respeito ao outro.
Será que ao mirar os olhos das cidades, as crianças se vêem refletidas ou vêem seus olhos – de desejos, anseios, curiosidade, autoria... - refletidos?
Será que não vêem miniadultos sem infância e, no entanto, muitas vezes, afetivamente infantilizados?
Em momentos de troca, ouvi que luno (luz) e o radical a (ausência) compõem a palavra aluno (sem luz).
É a ausência de luz que a criança ainda vê refletida ao mirar-se nos olhos dos professores que se intitulam mestres, mas se colocam como centro da relação com o conhecimento como se fossem a luz salvadora – o detentor e transmissor do conhecimento?
Posso afirmar que muitos e muitos (milhares) educadores já têm um novo olhar. Os que se reuniram no Seminário Latino Americano cujo tema foi o Olhar da Criança sobre a Cidade não se vêem mais sob este prisma. São profissionais que renovaram e renovam, a cada momento, seu olhar sobre a criança e a infância.
Necessitamos irradiar essa luz de nossos novos olhares. Multiplicar a nova concepção de criança que há por trás deles. E, efetivamente, construir mais espaços de aprendizagem ricos, estimulantes, desafiadores e possíveis para as crianças e para nós, educadores.
Se não devemos deixar de lutar enquanto todas as crianças de nosso planeta não forem felizes e reconhecidas em seus direitos, também, não podemos deixar de buscar, estudar, trocar, crescer, transformar e re-transformar nossas práticas, de modo a incentivar, propiciar e favorecer a que elas atribuam sentido à suas aprendizagens. Seus próprios sentidos e não os nossos; uma vez que são as experiências, relações e aprendizagens delas e não as nossas.
Respeitar o direito da criança cidadã é respeitar sua forma de significar e re-significar, construir, desconstruir e re-construir conhecimento.
A criança de ontem e de hoje são parceiras da criança da criança do futuro na construção do amanhã.
O educador de ontem e de hoje são parceiros do educador do futuro na construção do amanhã.
Não há como negar o que fomos e o que somos na ânsia de nos tornarmos melhores.
Assim como as crianças, merecemos tempo e precisamos aproveitar este tempo.
Não importa a velocidade e sim a direção para onde caminhamos, pois quando chegarmos “lá”, desejaremos seguir um pouco mais adiante. Isto faz parte da busca pela excelência. Como disse Paulo Freire: “A alegria não se dá apenas no encontro do achado, mas faz parte da busca. Ensinar e aprender não pode se dar fora da procura, fora da boniteza e da alegria.”

*Elaine David Pires é representante da RedSOLARE Brasil no Pólo São Paulo.